sexta-feira, 8 de abril de 2011

Pontos de passagem


Sem rumo, perante uma única certeza, que no final, a vida lhe mostrará como garantia, de que nada será hoje, como foi ontem e que sem ela nada o fará ser gente. Ouve-se no fundo da rua um grito - a plena satisfação, de se ver espelhado nas luzes dos candeeiros. Elas reflectem a solidão da noite e nos seus ombros, descansam agora os sonhos que tinham ficado à espera de serem vividos nos fundos de um olhar baço. A mulher é um pano de fundo, onde os seus dedos irão delinear os traços da sua silhueta, e há um desejo a crescer fomentando uma nova ordem, chegando a atingir os limites do irrazoável. O corpo dela, é uma forma entre muitas as que conheceu enquanto homem emparedado nas ruas, mas as suas linhas, são mais do que pontas entre muitas, que lhe dão a certeza, de que a vida, espera por enquanto, entre as quatro paredes do seu quarto. É lá que se abastece, para que as duas forças sejam uma a desafiar a noite. A mulher tem uma verdade escondida, segredos de muitas noites e muitos dias, em que a sua teimosia se fez verdade nas esperas que lhe indicavam que ele viria em corpo e se deixaria ficar no seu. As noites que os têm, já não são as mesmas noites que a esperavam sempre ao fim do dia, e ele tem nas ruas por onde passa um sonho ainda trancado à espera para decifrar as cores de um olhar feliz.

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Os seus passos são lentos, e os dela, afiguram-se a imagens de um filme a rodar, sempre a rodar em função de uma vida feita de cansaços. As imagens vão passando, em câmara lenta, e vêm-se os sonhos a cores e a preto e branco, os sorrisos numa face espraiando o medo, as curvaturas dos braços, o balançar do corpo, e um olhar baço a reconstituir as cenas e lugares, por onde andou. As mãos dele seguram-na para lhe avivar todos os pontos de passagem. A noite fecha-se para dar abertura ao dia. A espera é agora uma linha esticada por dentro de uma rua deserta.

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