quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Gestos



tudo o que faço

para remissão

dos meus pecados

são migalhas

nas mãos dos pobres


remeto-me ao silêncio
mas nem sempre
atinjo o estado de vigília
que me faça entrar
no círculo traçado
pelo tempo

sou talvez uma nova teoria
de mãos estendidas
a saber-se dona
de todos os gestos
que o silêncio engole

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Manifesto

haicai humedecido

na relva

que cresce ainda calada


são timbres da noite

pasmada

nos ramos que cortam o ar


na antemanhã nasce

um novo dia

abre caminho à solidão


há corpos ainda benzidos

dos sonhos

que viveram na noite


carimbo na folha caída

em pedras

rasgadas pelo vento


novas invernias nascem

entre os dedos

esqueléticos das mãos


manifesto duma idade

a cortar os

gestos pela metade


olhos ainda esbugalhados

farrapos

de vidas no chão


o dia amolece os gestos

enrijados

que se banham no rio


a água corre sempre

a jeito

parada na velha cidade

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Nada



Saí hoje para a rua
Desolada
Não tinha nada
Que me levasse
A criar algo
De novo

Talvez um pensamento
Talvez uma só palavra
Que se elevasse
Num só poema
Ímpar
Bem conseguido
Mas nada

Nem mesmo
Os meus sentidos
Se abriram
Para este nada
Que me fez hoje sair para a rua


A mesma rua
Que me conhece
Quando saio sozinha
Ou acompanhada

A mesma rua
Que se expõe ao dia novo
Que principia
E sempre acaba
Nos braços da noite

E eu sem saber como
Começo a saber-me
Mais do que um simples nada

Ando e desando
Por todos os becos escuros
Na tentativa
De encontrar uma nova rua
Sempre a tempo de me fazer
Criar algo

Talvez um sorriso
Talvez um olhar novo
Talvez uma sombra
Talvez o inverso de mim
Talvez o desejo
De me encontrar
Em outras ruas
E conhecê-las
Tal como elas me conhecem a mim
Sempre que saio
Sozinha ou acompanhada