sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Encontros

(Foto minha, tirada no inicio do Outono)

Não sei nada de mim
Mas há rumores
Que chegam com a chuva
Que se ouve lá fora

Agora são só pingos soltos
A quebrarem-se
Nas pedras
Da velha calçada

Mas o timbre do vento
Fala-me de outros sons
Em que nada perecia
E a vida acontecia

Um milagre
Nas tuas mãos vazias

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Vida

(escultura de Ricardo Kersting)

Gostava que o tempo nos visse passar juntos...

Talvez seja esse o segredo, para que a vida se manifeste e não cesse de vez,
nas mãos de quem pensa que morrer é um ponto certeiro, e não o sabe dianteiro nas novas movimentações da alma….

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Fina Flor

(foto D.M.)

Esvair de um sonho
Neste alucinado ar que respiro
Benfazejo sol da manhã
Que me cobre inteira
E me roça ao de leve
O peito nu

São letras tortas
Que escrevo
Neste caminho novo
Onde enquadro um rosto
E lhe desenho um corpo
Que me queira a jeito
De me ter sua
Enquanto m’enrolo
Neste lençol de pano cru

Tão cru
Quanto a estopa de linho
Que se faz vestes
Nas suas mãos
E se faz terra,semente
Ou fina flor somente

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Poema de amor


(Escultura - Ricardo Kersting)

Se eu pudesse
Abafar a minha voz
Na tua boca
Tanto quanto os meus olhos
Se fecham na noite
Ao firmar o meu corpo
Nos teus braços
E prolongar um ritual antigo
Como quando os meus lábios
Dançam na tua pele

Se eu pudesse
Seria a única voz
Silenciando os modos
De me reescrever
Do lado de dentro
De um único poema de amor

domingo, 26 de dezembro de 2010

Última lua


Este é o último dia de todas as noites que te imaginei no meu corpo
Vento forte uivando na noite como lobos da montanha
Vento do Norte que se fez cedo no meu acordar para a vida

(Em Agosto a terra é firme e o sol baixa ao nível dos meus sonhos)

Sentia que vinha e ia
Tal luz que se acende e se fecha a cada madrugar dos meus olhos
Sentia que o tinha
Mas não o sabia a acordar na minha cama

(Em Dezembro o solo é frouxo e a lua é estrada deserta nos caminhos

Esta é agora a última noite de todos os dias que o quero em vida
Como quando partia e chegava
E eu cegava ao sol por um amor tardio

(Em Março, a atmosfera é branca, e no monte há um novo rosmaninho)

Sempre soube que cor assumiam os seus olhos
E em remanso lhes peço
Que me levem, só por uma noite de absoluto degredo
Que me seja a última lua
********************
(Foto minha na Serra de Montemuro)

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Gostava de saber ser mulher

(tela de Paula Rego)


Gostava de saber ser mulher
perto, muito perto,
para poder abrir os braços e aconchegar-te assim
bem junto da minha boca
e dizer-te: amor meu, há um céu que me aguarda
para que nas tuas mãos
se construa um amor novo a equilibrar a terra
a Mãe que se faz poder e força no universo

Um amor poderoso
que te dissesse que eu também sou mulher
que vim de longe
de muito longe,
para olhar nos teus olhos
e dizer-te que a árvore
é a masturbação poética de um ponto
onde todos os poetas acreditam
coabitando ao mesmo nível da tua boca
dos teus olhos
e eu simplesmente mulher moldada de novo
pelas tuas mãos
********
Para ti que me sabes entre uma força e outra como um fio de luz

Fios de luz

(foto Dolores Marques - Rio tejo)


Caminhando sempre em frente, vejo as almas que se penduram nas árvores, nas tuas árvores caindo ao pequeno toque da alvorada.


- Os traços que deixam na atmosfera, são fios de luz que alcançam todos os transeuntes matinais. O rio é agora corrente parada aos meus olhos.
*********************************
(dedicado a uma pessoa grande talvez um Deus)

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Pontos de encontro

( Tela de Paula Rego)
*
Demorei tanto para chegar aí
E tu tão genuinamente Pessoa
Terna, e bela
E tu tão subtilmente Tu
Num doce sorriso
A construir novos horizontes
No meu olhar

Esquecer um mundo que ruiu
E que há sempre novas pontes
A alcançar os sonhos
Do outro lado do mundo
Onde a verdade
É feita de abraços
E poemas escritos
Com doces favos de mel

(Sentir, que me estão
A cobrir de mimos
E não conseguir ver
O AMOR
No meu lento caminhar)

Demorei tanto para te ver chegar
E chegaste assim tão leve
Tão breve na passagem
Onde o saber, é só….
Um hipotético desafio
Desafiando a vida
A escorregar no ventre
De quem tem sede
Expirando os verdes prados
Ensaiando a doce leveza
De um trago morno
Que é saber conduzir-me
Por um fio de luz
Acentuando os dias
Prontos para receber a vida
Em todas as formas únicas

(Saber-te no meu sonho distante
A reescrever novos temas
Afagos no meu corpo só
Originais formas de se saber
De um sorriso, e um poema
De uma força e uma vida cheia
De uma razão alheia
Nos vários pontos de encontro)
***********
(Poema também incluido na participação do concurso de poesia, da APPACDM de Setubal)

domingo, 5 de dezembro de 2010

Um Ser Apenas


(Menção Honrosa no xv Concurso de poesia, Um Sorriso, Um Poema, da APPACDM de setubal)

Eu não sei onde te encontrar
Se no caminho que trilho
Se na dança do meu corpo
Que se enleia aos sonhos
Que te espreitam
Do alto da minha torre de vigília
Peregrina neste sítio ermo
Onde rastejam
As minhas dúvidas terrenas
Que é saber-te pronto para chegar
*
(Vagabundo não come
Não se lava
Não se veste
Não se remedeia
Não tropeça nas pedras do caminho
Não demora para chegar
E nem verbaliza os traços
Que o fazem demorar)
*
E quero muito saber-me
Digna do meu corpo
Para contigo dançar
E comunicar em outros lugares
De um saber
Que me é dado à nascença
Para te escrever
Sobre um sorriso a bailar
No meu olhar
*
Tenho-te na ponta dos dedos
Quase a tocar as altas esferas
De um reino que há-de vir
Para te dizer de mim
Neste meu habitat natural
Nas noites e nos dias
Em que de um poema
Se compõe um sorriso
E de um sorriso
Se acaba um poema
*
E tu um
Ser apenas
Que breve se fez semente
A cair sobre o meu colo de mulher

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Cai o céu na escuridão



À noite a luz
É mais luz
Cai o céu na escuridão
E a estrela grávida
É um círculo imaginário
A perder-se nos dias
E nos momentos
Que nascem
Sem hora
Sem nora
Sem sim
E sem não

Luzes pendulares
Dourados os olhares
Meticulosas arestas
Ao encontro
De todos os desencontros
Pontos tornados vivos
Na escuridão

Súmulas de todos
Os encaixes tumulares
Ao relento
Sempre ao relento
Dos olhares
Que tombam
Nos arabescos
Registo nas palmas
Das minhas mãos

Gotículas em cascata
Fantasmas sem olhos
Corpos sem braços
Mãos sem dedos
Para escrever
Só para descrever
O cansaço
Este cansaço

E as dornas cheias
E as uvas
E o vinho
E o mosto
É rei posto
É vasto
O calafrio nos pés
Dos cantantes

Mutantes sem unhas
Sem dedos
Sem pele
E o mosto
É na boca
Ao desafio
Pelos cantos
De uma película
Que s’estranha
Tão estranha
Quanto a dor
Que se infiltra
Na minha pele

São medonhos
Os travestidos
Na escuridão
**********
(Foto minha - Luminescencia)

Dá-me um pouco mais


(foto minha - Luminescencias)


porque te exprimes assim
como se fosses o mundo
a cair-me em cima?

dá-me um pouco mais
mas breve
que seja assim
como a brisa nocturna
a calar-me nos momentos
em que te penso

dá-me um pouco mais
mas muito
que seja assim
como a brisa marítima
num único sorver do ar
a castigar-me todos os poros
acabados de nascer