terça-feira, 28 de dezembro de 2021

O frio de Dezembro

 

O frio de Dezembro chega sempre sem eu dar conta. 

Começo por contar os dias até ao aparecimento da doce melodia nascida no canto das aves. Arrumo por ali o olhar. 

Prefiro-o atento ao novo tempo da folhagem verde. Será ali, a nova morada, a aquecer o frio de Dezembro.


Darei conta, nesse tempo, de que existo ainda, para meu contentamento.

O céu continua vistoso num azul visto daqui debaixo.

As folhas mortas das árvores já se deram conta do fim da sua última viagem.

Mas como contar os dias até ao último dia de uma viagem incompleta?

Nada me daria mais cuidado, do que ter em mente uma data, sendo ela próxima ou longe da minha última viagem. 

Confundem-me os vários sentidos desta travessia.

O céu nem sempre é o céu. 

Tem momentos de revolta contra uma multidão, e, por isso, sofre.

Depois, o olhar nem sempre é cheio com prantos do céu.

O branco dos olhos é muitas vezes um céu sem lágrimas.

Lembro-me da última vez que chorei. Não sabia porque razão, 

não eram as lágrimas, correntes fora ou dentro do céu.

A resposta chegava através de um eco rude. 

Que poço fundo as terá recebido. Gostava de voltar a sentir o peso desse mortífero céu de água, por dentro dos olhos.

O céu continua vistoso, visto daqui debaixo.

Aqui em baixo, os rios, também nem sempre são cheios de céus de água.

Vagueio por entre os sons emitidos pelo arrastar da multidão. 

Prefiro os ajuntamentos aos ruídos do silêncio debaixo dos meus pés.

Ouço os sussurros de quem comenta com a voz corrompida, sobre a razão do meu sonambulismo. 

Inquieta, mas consciente, sopro de vez em quando, lufadas de ar quente para aquecer o rosto.

Dolores Marques natural de Moção

Os caminhos abrem-se, mas, apesar disso, a multidão continua a sustentar-se, unida, pelo sim ou pelo não, presa ao mesmo chão.


O frio de Dezembro chega sempre sem eu dar conta.


Onix, Dolores Marques

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